( imagem retirada da internet)
Depois de um grande desgosto de amor uma pessoa pode entregar-se à sua dor legítima, sentida e sincera, fazer o luto necessário durante o tempo que for preciso e depois respirar fundo, levantar a cabeça. Mas um desgosto de amor é sempre um desgosto de amor. E por vezes tão forte que nos rouba a vontade de viver.
Todos os anos há mulheres e homens que se matam por amor. Há e haverá sempre quem seja capaz de se matar por um
amor perdido, uma traição, um abandono.
O que leva alguém a terminar com a sua própria vida por outra pessoa é algo que me transcende.
Tive conhecimento de um caso destes, em que conheço familiares da vítima. Mais propriamente a sogra. Quando tomei conhecimento fiquei muito abalada, não tanto pela vítima, mas mais pelos filhos que deixou desamparados.
Um casal de jovens, ela muito nova quando casou (19 anos), ele 28 anos, para ela era o primeiro namorado, um pouco ingénua talvez. Casam e vão para a Alemanha trabalhar. Ele um homem muito ciumento, diria mesmo doente de ciúmes, ela coitada, aceitava tudo, pensando ou tentando aceitar como se fosse normal as atitudes dele. Nunca a deixou trabalhar, não lhe dava dinheiro, faziam as compras ao fim de semana sempre os dois, abria e lia toda a correspondência dela, mesma para a mãe, amigos, irmãos, etc. foi contra a 2ª gravidez por achar que um filho já tirava a atenção da mulher para com ele, quanto mais 2, etc. Ela foi ficando uma pessoa amargurada, triste, infeliz, até que passados 9 anos com a ajuda da mãe, resolveu dizer-lhe que regressava a Portugal com os filhos, porque era muito infeliz na Alemanha e que ele fizesse o que entendesse . Isto passou-me em Novembro passado. Regressou só com os bilhetes de avião, sem dinheiro e com os filhos. Conseguiu arranjar emprego muito rapidamente, até lá a mãe é que lhe valeu. No natal ele veio cá passar a quadra e parecia outro, muito carinhoso, atencioso, ela muito fria, porque tudo o que tinha sentido por ele já não existia. Ele regressou à Alemanha no início de Janeiro e depois de falarem várias vezes ao telefone ela diz-lhe que já não o ama, e que o melhor é separarem-se. No final de Janeiro ele manda um SMS à irmã a despedir-se e a pedir que ela contacte a polícia alemã para eles lá irem a casa. Quando lá chegam, têm que arrombar a porta e encontram-no já sem vida, depois de se ter enforcado.
Deixa 2 filhos o mais pequeno com 2 anos e o outro com 8. Deixa a mulher com um sentimento de culpa do tamanho do mundo, deixa a mulher numa situação económica desesperante, ao ponto de ter que vender a casa que tinham em Portugal , porque tinham um crédito bancário, que ela não consegue pagar, de ter que arranjar dinheiro para pagar vários créditos que ele tinha na Alemanha sem o seu conhecimento, etc.
Ter que enfrentar os sogros que a culpam pelo acontecido.
Cada vez que a história de um suicídio por desgosto de amor se repete, através de notícias de jornais ou de pessoas conhecidas, fico perplexa. A vida não acaba quando acaba um amor. A vida só acaba quando o corpo morre e o coração pára de bater. A ideia de infligir a própria morte é ainda mais assustadora do que a de roubar a vida a outra pessoa.
Todos os dias assistimos em directo a situações em que a vida humana sobrevive sob condições de tal forma violentas e precárias que põem a causa a capacidade de resistência dos seres humanos. E, no entanto, as pessoas sobrevivem. Sobrevivem a calamidades, doenças graves, desastres, torturas, prisões, morte de parentes, isolamento forçado, fome, medo, solidão, desespero. O que faz com que uma pessoa com uma vida mediana, uma família, um tecto, filhos, um modo de vida e, por conseguinte, uma vida própria escolha a morte parece-me inexplicável.